DONA JUDITE, berrou o Diretor ao interfone, e a porta da sala já se abria para dar passagem a uma secretária esbaforida, que se apressava para não desagradá-lo.
Procure o telefone do Dr Matoso dos Reis. Ordenou-lhe em voz alta e autoritária.
Dona Judite já com o grosso catálogo telefônico nas suas mãos trêmulas, talvez nem enxergasse as páginas! Quanto mais aquela abundância de números, dos quais só precisava de um.
E já berrava outra vez o feitor Constantino: Dona Judite, vejo que a senhora ainda não aprendeu sequer a achar um simples número na lista de telefones. Grande secretária que a senhora é! Faça-me então o favor: retire-se imediatamente. Leve consigo esse catálogo telefônico quando for para a sua casa. Aproveite o seu fim de semana treinando encontrar números telefônicos na lista, para ser eficiente da próxima vez que eu precisar.
Dona Judite caiu em pranto, e dali retirou-se com a lista nas mãos. Nem sei como lhe foi possível reencontrar a porta por onde há pouco entrara.
E foi voltando outra vez aos empresários ao meu lado, que aquele homem ensandecido, agora em tom ameno, continuou desta vez sorridente e bem humorado:
A Dona Judite trabalha comigo há muitos anos! Outro dia vocês não sabem o que me aconteceu! Convidei-a para passar um fim de semana comigo, na casa de campo que tenho em Gravatá. Vocês sequer imaginam! Primeiro, que ela topou na hora. Fui para lá no fim de semana conforme combinado. Estava a esperá-la, na expectativa dos dias que passaríamos juntos, quando finalmente ela chegou. Com ela trazia o noivo!
Seguiram-se boas gargalhadas do autor dessa história, diante do olhar incrédulo de todos nós que mal acreditávamos no que ouvíamos.
Em seguida sairam o pai e o filho, para em seus lugares sentarem dois candidatos à uma vaga de vendedor.
E enquanto isso, voltava-se para mim o diretor carrasco, para iniciar uma entrevista que se ali teria começo, não parecia que teria fim. Por sentir-me no foco e pelo teor tão carregado de apreensões, mais parecia que eu era o alvo de uma CPI.
Disse-me inicialmente o Sr Constantino:
Então, você é o interessado na nossa vaga para auxiliar técnico! Pelo menos você sabe como se grafa a palavra Ohm? E estendendo-me uma folha de papel em branco e uma caneta, ausentou-se da sala por alguns instantes.
Subentendi, achando estranho, que ele pretendia que ali eu escrevesse o sobrenome daquele que foi o autor da mais popular das leis da eletricidade: a lei de Ohm. Me senti ridículo, pois não precisava começar a me testar tão de baixo!
Ao voltar, eu já havia "grafado" a palavra Ohm na folha de papel até a pouco imaculadamente branca. O fiz em letras garrafais decidido a que não perderia chance de exaltar os meus saberes.
Mais de uma hora entretanto passaria, até que outra vez ele voltasse a me dar atenção.
Enquanto isso, aproximou-se dos dois nervosos candidatos a vendedor. Em pé junto a eles, tinha as duas mãos nos bolsos. E foi assim que perguntou, sem definir a quem dirigia a palavra:
Quanto vocês ganhavam, no seu último emprego como vendedor?
Um dos candidatos iniciou balbuciante a responder, dizendo:
Na minha carteira de trabalho consta...
Foi interrompido pelo entrevistador, com indelicadeza:
Não perguntei ao senhor o quanto consta na sua carteira de trabalho. Perguntei isso sim, quanto o senhor ganhava.
Na sequência, e parecendo desinteressar-se da resposta, prosseguiu:
Vocês já conheceram o Sr Quental?
E outra vez ao interfone, gritava a plenos pulmões: Dona Judite, diga ao seu Quental que estou chamando.
Era incrível a rapidez com que as ordens de comando daquele homem eram obedecidas. Logo entrava na sala o Sr Quental que agora, além de tudo, suava.
Assim falou o Sr Constantino aos vendedores, na presença do Sr Quental, que aparentava condições emocionais lastimáveis.
Este é o Sr Quental. O chefe de vendas da Eletromar. Caso os senhores sejam contratados, terão de trabalhar subordinados a ele. Chamei-o aqui para apresentá-lo e dizer que o Sr Quental é o símbolo da incompetência, e do fracasso resultante da sua inoperância.
E virando para o Sr Quental:
Pode se retirar! Chamei-o apenas para que eles o conhecessem.
O Sr Quental retirou-se lívido, e com ele as minhas últimas esperanças.
Em seguida eram dispensados os dois possíveis futuros vendedores, que aparentemente saiam com suas entrevistas inconclusas. A mim não pareceu que viessem a ser contratados.
Era chegada a hora do almoço. O Sr Constantino já apanhara o paletó e agora o vestia. Completava-lhe a indumentária, um chapeuzinho que parecia de feltro, à antiga moda Nat King Cole. Sem olhar para mim, falou algo que deduzi ser comigo, pois era o único dos coadjuvantes na sala.
Acho melhor, para ganhar tempo, que me acompanhe enquanto eu almoçar.
E em seguida emendaria:
Não! Prefiro que você também vá para o seu almoço, e volte às 14 horas para continuar.
Disse-me inicialmente o Sr Constantino:
Então, você é o interessado na nossa vaga para auxiliar técnico! Pelo menos você sabe como se grafa a palavra Ohm? E estendendo-me uma folha de papel em branco e uma caneta, ausentou-se da sala por alguns instantes.
Subentendi, achando estranho, que ele pretendia que ali eu escrevesse o sobrenome daquele que foi o autor da mais popular das leis da eletricidade: a lei de Ohm. Me senti ridículo, pois não precisava começar a me testar tão de baixo!
Ao voltar, eu já havia "grafado" a palavra Ohm na folha de papel até a pouco imaculadamente branca. O fiz em letras garrafais decidido a que não perderia chance de exaltar os meus saberes.
Mais de uma hora entretanto passaria, até que outra vez ele voltasse a me dar atenção.
Enquanto isso, aproximou-se dos dois nervosos candidatos a vendedor. Em pé junto a eles, tinha as duas mãos nos bolsos. E foi assim que perguntou, sem definir a quem dirigia a palavra:
Quanto vocês ganhavam, no seu último emprego como vendedor?
Um dos candidatos iniciou balbuciante a responder, dizendo:
Na minha carteira de trabalho consta...
Foi interrompido pelo entrevistador, com indelicadeza:
Não perguntei ao senhor o quanto consta na sua carteira de trabalho. Perguntei isso sim, quanto o senhor ganhava.
Na sequência, e parecendo desinteressar-se da resposta, prosseguiu:
Vocês já conheceram o Sr Quental?
E outra vez ao interfone, gritava a plenos pulmões: Dona Judite, diga ao seu Quental que estou chamando.
Era incrível a rapidez com que as ordens de comando daquele homem eram obedecidas. Logo entrava na sala o Sr Quental que agora, além de tudo, suava.
Assim falou o Sr Constantino aos vendedores, na presença do Sr Quental, que aparentava condições emocionais lastimáveis.
Este é o Sr Quental. O chefe de vendas da Eletromar. Caso os senhores sejam contratados, terão de trabalhar subordinados a ele. Chamei-o aqui para apresentá-lo e dizer que o Sr Quental é o símbolo da incompetência, e do fracasso resultante da sua inoperância.
E virando para o Sr Quental:
Pode se retirar! Chamei-o apenas para que eles o conhecessem.
O Sr Quental retirou-se lívido, e com ele as minhas últimas esperanças.
Em seguida eram dispensados os dois possíveis futuros vendedores, que aparentemente saiam com suas entrevistas inconclusas. A mim não pareceu que viessem a ser contratados.
Era chegada a hora do almoço. O Sr Constantino já apanhara o paletó e agora o vestia. Completava-lhe a indumentária, um chapeuzinho que parecia de feltro, à antiga moda Nat King Cole. Sem olhar para mim, falou algo que deduzi ser comigo, pois era o único dos coadjuvantes na sala.
Acho melhor, para ganhar tempo, que me acompanhe enquanto eu almoçar.
E em seguida emendaria:
Não! Prefiro que você também vá para o seu almoço, e volte às 14 horas para continuar.
Prosseguirei esse "Tudo Pode Acontecer" na postagem seguinte: Ato III.
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