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terça-feira, 7 de abril de 2015

Apesar do Risco.



A pensão do Moraes pareceu-me um lugar apropriado para o bolso de um estudante, que de passagem por Lisboa em direção à Manchester, na Inglaterra, pretendia ali ficar por três dias.

Era a minha primeira viajem internacional. Sob o patrocínio da CAPES (Centro de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior), fui prosseguir no UMIST (University of Manchester Institute of Science and Technology) os estudos de pós-graduação em engenharia elétrica, iniciados no Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Federal da Paraíba, em Campina Grande.

Desembarquei tarde da noite, vindo do Recife, no aeroporto de Lisboa. A alegria do desembarque porém, logo cederia lugar à apreensão. Levado por um táxi à Pensão do Moraes, descobri que ali não tinha vaga!

O taxista me disse conhecer onde havia, nas redondezas, algumas alternativas àquela hospedaria. Nos dirigimos a cada uma delas, para ouvir sempre a mesma resposta: lotada.

Não deviam ser poucos os turistas de classe muito econômica na cidade. Nem estudantes lisos como eu, pois logo se afigurou impossível encontrar vagas.

O tempo passava, ficava cada vez mais tarde da noite, e o taxímetro não parava de funcionar. Antes que o Sr Domingos, que era como se chamava o idoso taxista, terminasse por me levar para uma hospedagem de padrão suspeito ou duvidoso, autorizei-o à busca de um hotel, ainda que, de melhor qualidade. Poderia até mesmo, em último caso, ser algum hotel realmente bom.

O Sr Domingos teve a sensibilidade de iniciar a procura na direção crescente do número de estrelas. Além disso, quando a certa altura da busca só restava ir para algum hotel de luxo, ele percebeu muito bem em que fria eu me metera. 

Educadamente, o Sr Domingos pediu-me licença para fazer uma ligação telefônica, e como vivíamos o ano de 1972, parou a Mercedes-Benz de cores verde e preta nas proximidade de um telefone público, para onde se dirigiu.

Após alguns minutos do que me pareceu uma prolongada conversa, ele voltando para o carro, assim falou: vejo que não vais mesmo conseguir vaga em nenhum hotel! Esta época do ano (mês de julho) estão cá todos lotados!

Se aceitas, podes vir a ficar em minha casa, em lugar do hotel! Já tenho autorização da minha mulher, com quem há pouco estava no aparelho a falar.

E continuando disse o Sr Domingos: não foi fácil ela aceitar, porque da última vez que hospedamos um brasileiro, ele nos roubou. Mas penso que agora não deva ser o mesmo caso.

Aliviado por pelo menos suscitar apenas tão leve dúvida a esse respeito, agradeci aceitando, ou não lembro se foi o contrário, isto é, se aceitei agradecendo.

O Sr Domingos e a sua esposa Dona Alice, me acomodaram no quarto que pertencera ao filho do casal que imigrara para o Canadá. 

Acordei no dia seguinte, não muito cedo, porém totalmente descansado, para
um pequeno almoço que por pouco não seria mesmo um almoço inteiro. Era tempo de aproveitar um maravilhoso fim de semana, de sol e temperatura amena. O Sr Domingos ofereceu-se para, no seu carro particular, um pequeno mini-Austin, e ao custo de que eu apenas pagasse a gasolina, levar-me para conhecer um pouco de Lisboa e seus belos arredores.

Foi assim que, nas minhas primeiras horas em Portugal, provei  da queijada de Sintra, do vinho de Colares e dos pastéis de Belém. Andamos por Sintra, Cascais, Boca do Inferno e Estoril. E ainda houve tempo para que na volta eu pudesse ver, deslumbrado, a magnificência do Mosteiro dos Jerônimos e com admiração a Torre de Belém e o Monumento aos Descobrimentos.

No domingo ainda teria o tempo necessário para explorar a pé o belo centro de Lisboa, e finalmente, já na segunda feira seguinte, ser levado pelo Sr Domingos ao aeroporto, quando finalmente prossegui viagem.

Jamais a minha impressão favorável a Portugal, formada desde um primeiro instante, viria a ser desfeita. Muito pelo contrario, encontraria depois muitas ocasiões em que seria reforçada pelo espírito generoso e amigo das pessoas que me foi dado por lá conhecer.

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